Randa Kamel - uma entrevista com a estrela egípcia

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photo Dave Halley

por Isis Zahara


"Tutor: Qual é a sensação quando você está dançando? 
Billy: Não sei. Me sinto  bem. Alguma coisa forte e que,  quando eu começo ...  eu gosto, esqueço tudo. E ... e desapareço. Eu sinto uma mudança no meu corpo todo. E eu sinto fogo no meu corpo. Eu sou algo que voa, como um pássaro. Como  eletricidade. Sim, como a eletricidade."  
Billy Elliot (2000)



  Entrevistar Randa não é uma coisa fácil e eu não teria sucedido sem a ajuda do professor Mohamed Shahin que traduziu as perguntas para o árabe.
Randa Kamel é uma estrela egípcia internacionalmente aclamada no meio da Dança Oriental.  
Começou dançando para  a Troupe de Mahmoud Reda  até tentar carreira  solo. Seu primeiro momento de destaque como bailarina  foi no hotel Meridien no Cairo, onde ela compartilhou o palco com - nada mais nada menos que - Fifi Abdou.  Mas, a época dos grandes shows teve sua crise e os hotéis de luxo fecharam suas casas de show. Randa saiu do Meridien e foi para o Sheraton, mas logo as portas também se fecharam e Randa teve que se mudar para o Cruzeiro Nile Maxime, que ainda assim é o mais considerado e disputado pelas estrelas. A carreira de Randa deixa como pano de fundo a decadência da economia egípcia e o preconceito contra os shows de dança oriental.
Randa tem um estilo único, embora há quem diga que ela copie Dina, mas nos últimos anos quem não se inspirou na polêmica diva Dina? Randa é enérgica, seus shimmies têm sido descritos como "terremotos" e seu sucesso mundial a conduziu tornar-se umas das grandes estrelas da dança Oriental. Além de uma série de DVDs Randa tem sua própria grife de figurinos de alta qualidade.  
Ela não gosta muito de falar, e seus cursos são de pouca explicação, aprender com Randa é no estilo antigo, aprende-se dançando, aprende-se a sentir a melodia e o coração. 


"Quando eu vejo algumas bailarinas apresentarem minha dança
 ou minha cultura de forma errada
Eu me sinto mal sobre isso. Eu quero gritar
 alto e dizer "Não isso é errado!"


IZ - Para ser uma estrela no Egito a pessoa tem que ter um dom especial que a torne inesquecível. Um estilo, um carisma, perfeição técnica. Você acredita ter alcançado esse patamar a se tornar uma lenda da dança oriental?
 Randa - Eu desejo a Deus para ser assim. Mas o público é a crítica para isso. Eu não posso responder a esta pergunta para mim. O que posso dizer é que eu trabalho duro, muito duro, e eu amo o que faço, e é claro que eu adoraria ser um dia considerada uma lenda.



 
IZ - Que profissionais têm influenciado a sua dança ou quem te inspira mais? 
Randa - Desde que eu era muito jovem, eu amava dançar e isso capturou minha alma. Todo mundo previa que eu seria uma dançarina. Nesta época, eu amava a Samia Gamal. Ela era o meu conto de fadas, porque ela dançava ao lado de Farid Al Atrash. Eu era uma de suas maiores fãs, eu queria ser a  Samia  só para dançar ao lado dele.  
Samia Gamal sempre me inspirou com sua elegância na dança,  porque ela tem uma alta sensibilidade para a música e eu sempre almejei ter isso no meu trabalho. Eu também adoro suas mãos, movimentos do ombro e expressões faciais. Quando cresci, comecei a apreciar Naima Akef outra bela dançarina. Até agora, mesmo quando eles mostram filmes na TV com Samia Gamal e Naima Akef minha família  me chama para assisti-las. Até hoje eu me inspiro em ambas. Eu assisti tantas vezes as suas performances que eu sei exatamente todos os passos que estão por vir durante cena.


NizArt - photo


IZ - Às vezes eu ouço as pessoas dizerem: "Randa é da velha escola, ela dança com o coração". Você acha que atualmente está faltando espontaneidade e / ou eletricidade na Dança Oriental?
 Randa - Não há escola velha ou nova escola na dança, a coisa mais importante é sentir. A dança oriental, sem sentimento não é de dança oriental e é isso que um monte de pessoas precisa entender.  
Uma bailarina técnica sem nenhum sentimento, irá perder todo o seu público, porque ela não pode capturar ninguém, sem sentimentos. No Egito a dança não é uma máquina, não há 1-2-3-4. Quando você perde o sentimento e a alma, então você não está dançando, você está apenas reproduzindo algo. Qualquer pessoa que se tornou uma estrela foi porque recebeu um dom de Deus. Ele dá a sensação, o talento e o carisma da dança. Isto não é sobre o Egito, isso diz respeito muito mais às pessoas no exterior. Toda vez que viajo, falo sobre o sentimento como sendo a parte mais importante desta dança. Você também deve compreender a música e ter a letra traduzida de modo que você deve saber o que está dançando. Quando eu ensino explico o sentimento e a letra da música. Uma coisa é quando os meus alunos aprendem a técnica e outra completamente diferente quando eles assistem as  minhas emoções e expressões. Eu vejo pessoas que acreditam que sabem dançar, mas não sabem nada. Elas estão muito longe de serem bailarinas orientais, porque elas não têm sentimentos nenhum, somente matemática.  A Dança do ventre é muito maior do que isso, você como  dançarino precisa apresentar tudo o que você tem. Se você tiver apenas técnica o público vai ficar entediado dentro de 5 minutos assistindo você. Você deve ter sentimento, técnica e expressão, deve ter todo o pacote para interpretar a verdadeira Danca Oriental. 

"Não há escola velha ou nova escola em dança,
  a coisa mais importante é sentir. 
A dança oriental, sem sentimento
 não é dança oriental e é isto que muitas  pessoas andam fazendo. "


IZ - Quando você não está dançando com seu corpo  você está dançando com sua mente?
Randa - Sim, eu sempre danço com a minha mente. Minha vida é o meu filho, a minha família e a dança. Eu posso estar dormindo a noite e imaginando movimentos. Eu salto para fora da minha cama dançando. Quando minha família me vê fazendo isso eles acham que eu sou louca. Mesmo quando eu estou dirigindo, andando, ou indo para minha vida diária a dança está dentro de mim. Se eu não danço com meu corpo, eu estou sempre dançando com a minha mente. 




IZ - O que a faz apaixonada pela dança?
Randa- Não há nada específico que eu posso dizer que me fez apaixonar-me pela dança. A dança está no meu sangue. Nasci com ela. Eu tive um passado difícil com a minha família e a minha escolha para ser uma dançarina profissional. Os obstáculos que tive de enfrentar fizeram-me mais apaixonada pela dança oriental. Quando eu era jovem meus pais  costumavam me bater porque eu ia as casas dos meus vizinhos e dançava em seus casamentos e festas. Eu nasci em uma cidade muito conservadora chamada El Mansoura e é tão difícil ser uma dançarina em uma cidade conservadora. Eu realmente não tenho uma resposta sobre o por que eu amo dançar, mas se você quiser me fazer feliz, basta colocar uma música e pedir para eu dançar. Há algo também que eu sempre me lembro: Quando eu era criança, eu ia a festas e esperava as pessoas me tirarem para dançar. Isso me fazia eu me sentir amada e, talvez, essas são as razões pelas quais eu sou tão apaixonada pela dança.


 


IZ - Qual estilo de música você gostaria de realizar? Ouvi dizer que você gosta mais dos clássicos como Um Kulthum. Por quê?
Randa - Quando eu comecei a dançar  eu adorava Um Kulthum ou qualquer música difícil de interpretar. Eu sempre escolhia a música mais difícil para que as pessoas reconhecessem que eu tinha um excelente conhecimento musical. Depois de um tempo eu comecei a dançar  Balady e eu fiquei apaixonada por esse estilo mais popular (Acordeom e tabla Balady com progressão musical especifica do Egito). Então eu comecei a dançar oriental moderno e me apaixonei também. Basicamente, eu estou enamorada com todo o repertorio de músical de dança oriental. Eu amo Um Kulthum especificamente porque tudo em suas canções é perfeito: as letras, a música, há muito sentimento dentro ou algo incomum sobre suas canções que roubam meu coração.



"Eu vejo pessoas que pensam que dançam a dança do ventre,
 mas não estão dançando nada. Elas estão longe de ser dançarinas
orientais, porque elas não sentem nada em suas danças. "


IZ - O que você sente  antes de ir para o palco?
Randa - É diferente a cada momento para quem eu estou dançando e o que eu estou dançando. Há uma diferença quando eu danço para os dançarinos, para os estrangeiros ou quando eu danço para o povo egípcio. Cada público exige que eu seja um artista diferente e se eu fazê-los felizes serei feliz.

"Para ser um grande professor,
 você deve aprender como ensinar.
 Você tem que saber o que você está fazendo,
você deve saber como apresentar a devidas
informações da maneira correta.
 Isso também requer um talento, assim como dançar."


IZ-Você percebe alguma coisa diferente quando se apresenta fora do Egito?
Randa - Quando eu danço fora do Egito  eu sinto que sou uma mensageira do meu país e minha cultura. Eu quero apresentar o melhor sobre meu país de onde eu sou da maneira certa e eu tomo isso como uma enorme responsabilidade, em ser fiel à minha cultura. Quando eu vejo dançarinas se apresentarem em nome de minha dança ou minha cultura no caminho errado eu me sinto muito mal. Eu quero gritar bem alto e dizer "Não, isso é errado!". Por outro lado, se eu ver artistas estrangeiros se apresentando de forma correta eu me sinto feliz.


photo - Dave Halley

 
IZ - Como é Randa  fora do palco? O que a faz você feliz?
Randa - Eu sou como qualquer um. Eu sou uma pessoa muito simples, na maioria das vezes estou em casa com meu filho e minha família. O que eu realmente gosto de fazer é voltar para minha cidade natal e passar tempo com meus amigos de infância, isso realmente agrada meu coração e alma. Outra coisa que me faz feliz é ser bem sucedida na minha carreira e minha vida pessoal.

IZ - O que você acha que é o futuro da dança do ventre egípcia nos próximos anos?
Randa - Minha opinião é que a dança oriental é o Egito. Não existe nenhuma diferença entre os dois. Egito será sempre considerado a mãe da dança oriental e a terra desta dança. Sobre os problemas políticos atuais, eu acho que esta é uma situação temporária e não vai mudar a história ou o futuro da dança do ventre.


photo Dave Halley


IZ - Ser uma estrela da dança Oriental, ter sua própria orquestra, ser um ótimo interprete  faz de você um bom professor ou não?  A capacidade de ensinar exige um talento diferente?
Randa - Dançar com música ao vivo não é suficiente para torná-lo um bom professor e que certamente não lhe dá a devida competência para ensinar. Para ser um grande professor, você deve estudar como ensinar. Você tem que saber o que você está fazendo,  deve saber como apresentar a informação adequada da maneira correta. Isso também requer um talento. Você deve deixar sua impressão digital, sua identidade, seu estilo na dança. Nem todo artista pode ser um bom professor, e um bom professor nem sempre é um bom intérprete. Por favor, mantenha isso em mente e o que você está estudando, com quem está aprendendo e como será o resultado para poder ensinar. 

"Dança do Ventre é muito maior do que isso,
 você como um bailarino precisa apresentar tudo o que tem.
Se você tiver apenas técnica o público vai ficar entediado dentro de 5 minutos. Você deve ter técnica, sentimento e expressão, você deve ter o pacote inteiro para executar a dança Oriental verdadeira. "


IZ - Quem você considera uma estrela egípcia? Por quê?
Randa - O Egito é cheio de estrelas, algumas estrelas já passaram e algumas ainda estão aqui. Há muitas estrelas que eu considero: Samia Gamal, Naima Akef, Tahaya Karioka, Nagwa, Nahed Sabry, Fifi Abdou, Dina, são muitos nomes para citar. Por exemplo, um dançarina que amo muito, Samia Gamal, ela é uma verdadeira e eterna estrela, porque ela amava o que fazia e acrescentou muito a dança oriental. Ela tinha seu estilo próprio  criou e trabalhou realmente duro pela dança. Mas cada estrela que eu mencionei também tinham seus estilos próprios, suas assinaturas e é por isso que elas são inesquecíveis.


IZ - Há rumores de que há tantas bailarinas estrangeiras no Egito, porque não há  dançarinas egípcias mais, onde estão os dançarinos do Egito? Você acha que haverá novas Estrelas egípcias no futuro?
Randa - Primeiro de tudo, o Egito é para todos. A dança não é só para os egípcios. É normal e fico feliz em ver estrangeiras dançando aqui. Mas devemos considerar que muitas egípcias estão perdendo seus empregos, porque os proprietários de alguns estabelecimentos preferem pagar mais barato. Agora, a maioria dos barcos estão cheios de estrangeiros e as verdadeiras dançarinas egípcias são forçadas a ir para  locais de baixa  classe como na rua Haram e isso as deixa frustradas, claro! Mas ainda há muitas bailarinas egípcias e é claro que eu acredito que haverá novas estrelas nativas no futuro. Este não será o fim das estrelas. A dança está no nosso sangue e eu acredito no futuro.

 

Um comentário:

  1. PERFEITO! É isto que muita gente precisa ler, não só no Brasil como no mundo todo da DV!!! Gratíssima por compartilhar! Luz sempre!

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